Ilustríssimos picaretas, excelentíssimos vagabundos, por Fábio de Oliveira Ribeiro
A lista de deveres e o rol de vedações impostas aos membros do MPF é grande, mas vale a pena reproduzir aqui dois artigos da LEI Nº 8.625, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1993.
“Art. 43. São deveres dos membros do Ministério Público, além de outros previstos em lei:
I – manter ilibada conduta pública e particular;
II – zelar pelo prestígio da Justiça, por suas prerrogativas e pela dignidade de suas funções;
III – indicar os fundamentos jurídicos de seus pronunciamentos processuais, elaborando relatório em sua manifestação final ou recursal;
IV – obedecer aos prazos processuais;
V – assistir aos atos judiciais, quando obrigatória ou conveniente a sua presença;
VI – desempenhar, com zelo e presteza, as suas funções;
VII – declarar-se suspeito ou impedido, nos termos da lei;
VIII – adotar, nos limites de suas atribuições, as providências cabíveis em face da irregularidade de que tenha conhecimento ou que ocorra nos serviços a seu cargo;
IX – tratar com urbanidade as partes, testemunhas, funcionários e auxiliares da Justiça;
X – residir, se titular, na respectiva Comarca;
XI – prestar informações solicitadas pelos órgãos da instituição;
XII – identificar-se em suas manifestações funcionais;
XIII – atender aos interessados, a qualquer momento, nos casos urgentes;
XIV – acatar, no plano administrativo, as decisões dos órgãos da Administração Superior do Ministério Público.
Art. 44. Aos membros do Ministério Público se aplicam as seguintes vedações:
I – receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais;
II – exercer advocacia;
III – exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, exceto como cotista ou acionista;
IV – exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de Magistério;
V – exercer atividade político-partidária, ressalvada a filiação e as exceções previstas em lei.
Parágrafo único. Não constituem acumulação, para os efeitos do inciso IV deste artigo, as atividades exercidas em organismos estatais afetos à área de atuação do Ministério Público, em Centro de Estudo e Aperfeiçoamento de Ministério Público, em entidades de representação de classe e o exercício de cargos de confiança na sua administração e nos órgãos auxiliares.”
No exercício de sua função, um procurador federal não pode proteger ou prejudicar deliberadamente quem quer que seja, tampouco deve atuar em casos em que tenha interesse pessoal. Advocacia administrativa é crime. O impedimento ou suspeição do procurador pode acarretar nulidade processual insanável. Quando atua num processo o procurador não deve obter lucro pessoal, nem tampouco garantir que um terceiro (parente, amigo, parceiro, amante, etc) faça isso.
A denúncia feita pelo jornalista Leandro Demori atinge em cheio as pessoas dos procuradores federais que atuaram na Lava Jato e se tornaram suspeitos de beneficiar o pai de Gabriela Hardt. Alguns deles podem ter desrespeitado suas obrigações e vedações funcionais. É essencial que o caso seja levado ao conhecimento do CNMP, órgão competente para processar e julgar os desvios de conduta dos membros do MPF. Caso isso não ocorra, todos os procuradores federais passarão a ser suspeitos de serem ilustres picaretas.
Os juízes federais também tem obrigações funcionais e vedações profissionais. Abaixo destaco algumas das normas que eles devem cumprir:
LEI Nº 5.010, DE 30 DE MAIO DE 1966
“Art. 28. É vedado aos Juízes Federais e Juízes Federais Substitutos:
I – exercer atividade político-partidária;
II – participar de gerência ou administração de emprêsa industrial ou comercial;
III – exercer comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive de sociedade de economia mista, de que o poder público tenha participação majoritária, exceto como acionista, cotista ou comanditário;
IV – exercer função de árbitro ou de juiz, fora dos casos previstos em lei.”
LEI COMPLEMENTAR Nº 35, DE 14 DE MARÇO DE 1979
“Art. 35 – São deveres do magistrado: (Vide ADPF 774)
I – Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;
II – não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar;
III – determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais;
IV – tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.
V – residir na sede da Comarca salvo autorização do órgão disciplinar a que estiver subordinado;
VI – comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término;
VIl – exercer assídua fiscalização sobre os subordinados, especialmente no que se refere à cobrança de custas e emolumentos, embora não haja reclamação das partes;
VIII – manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.
Art. 36 – É vedado ao magistrado: (Vide ADPF 774)
I – exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista;
II – exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração;
III – manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.”
No exercício de sua função, um juiz federal também não pode proteger ou prejudicar deliberadamente quem quer que seja, tampouco deve atuar em casos em que tenha interesse pessoal. A incompetência, impedimento ou suspeição do juiz pode acarretar nulidade processual insanável. Quando atua num processo o juiz não deve obter lucro pessoal, nem tampouco garantir que um terceiro (parente, amigo, parceiro, amante, etc) faça isso.
A juíza federal Gabriela Hardt substituiu Sérgio Moro na condução da Lava Jato durante algum tempo. Ela ganhou notoriedade por ter proferido uma sentença condenatória contra Lula que foi anulada em razão do texto ter sido “copiado e colado” de outra decisão.
A denúncia feita pelo jornalista Leandro Demori atinge em cheio a pessoa dessa juíza. Gabriela Hardt pode ser considerada suspeita de ter protegido os interesses econômicos do pai dela. É essencial que o caso seja levado ao conhecimento do CNJ, órgão competente para processar e julgar os desvios de conduta dos membros do Poder Judiciário. Caso isso não ocorra, todos juízes federais passarão a ser suspeitos de serem excelentíssimos vagabundos.
“Democracia é coisa frágil. Defendê-la requer um jornalismo corajoso e contundente. Junte-se a nós: www.catarse.me/jornalggn”
Aqui mesmo no Jornal GGN eu exigi uma Lava Jato da Lava Jato. A gravíssima denúncia feita pelo jornalista Leandro Demori pode e deve ter consequências jurídicas, funcionais e eventualmente criminais.
O CNMP e o CNJ podem e devem afastar os suspeitos de seus cargos. A história funcional e a evolução patrimonial dos envolvidos (e dos parentes deles também) terão que ser investigados minuciosamente. O termo inicial dessa investigação deve ser março de 2014, data reconhecida pelo próprio MPF como sendo o início da Lava Jatohttps.
O sigilo da comunicação eletrônica e telefônica dos procuradores e de Gabriela Hardt poderão ser quebrados. Caso as suspeitas sejam confirmadas por provas documentais, periciais e testemunhais, aqueles que cometeram irregularidades devem ser severamente punidos. Se não existirem provas da existência da suposta conspiração urdida para facilitar o enriquecimento ilícito de Jorge Hardt Filho e dos sócios dele os procuradores e a juíza deverão ser absolvidos.
As suspeitas que pairam sobre os heróis/vilões lavajateiros afetam de maneira negativa as instituições a que eles pertencem. Enquanto nada for feito, o MPF e a Justiça Federal poderão ser tratadas como se fossem organizações criminosas que protegem procuradores e juízes que usaram seus cargos para enriquecer e enriquecer os familiares deles. A credibilidade destas instituições é fundamental para que o Brasil possa julgar aqueles que cometem crimes federais e pacificar os conflitos entre a União e seus cidadãos/empresas privadas.
Não só isso, a imagem que o Brasil projeta no exterior também pode ser comprometida em decorrência desse novo escândalo. Afinal, a Lava Jato é um fenômeno que despertou atenção do mundo inteiro e já foi mencionada nos maiores jornais norte-americanos e europeus.
Fábio de Oliveira Ribeiro, 22/11/1964, advogado desde 1990. Inimigo do fascismo e do fundamentalismo religioso. Defensor das causas perdidas. Estudioso incansável de tudo aquilo que nos transforma em seres realmente humanos.
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Fonte: GGN