Do Institucional ao Individual: A Urgência do combate ao Racismo nas Instituições Bancárias

A história legislativa brasileira reflete a lenta, mas necessária, evolução do reconhecimento e da criminalização da discriminação racial. O primeiro marco importante foi a Lei Afonso Arinos (Lei n° 1.390/51), que, em 1951, tornou contravenção penal a discriminação racial no Brasil. Apesar de ser um avanço inicial, sua natureza de "contravenção" demonstrava a leveza com que o tema era tratado à época. Posteriormente, a Lei n° 7.716/89, conhecida como Lei do Crime Racial (após diversas alterações, como as da Lei n° 9.459/97), tipificou o crime de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, com penas mais severas, estabelecendo que a prática, indução ou incitação de discriminação são crimes inafiançáveis e imprescritíveis. Mais recentemente, a Lei n° 14.532/23 equiparou a injúria racial ao crime de racismo. Antes, a injúria racial era tratada no Código Penal, com pena e prescrição distintas do crime de racismo, mas agora, ao ser tratada de forma análoga ao racismo, torna-se inafiançável e imprescritível quando praticada no contexto de elementos referentes a raça, cor, etnia ou procedência nacional. Esse aparato legal demonstra o crescente rigor do Estado brasileiro no combate a todas as formas de preconceito e discriminação racial, exigindo das empresas a conformidade e a responsabilidade social.
O Racismo institucional e corporativo representam manifestações da discriminação racial que se enraízam nas estruturas, normas, políticas e práticas das organizações, resultando em desvantagens sistemáticas para indivíduos ou grupos em função de sua raça ou cor. Ele opera de forma estrutural e, muitas vezes, velada, perpetuando desigualdades no acesso a oportunidades, na progressão de carreira, na remuneração, e até mesmo no ambiente de trabalho. Isso pode se manifestar, por exemplo, em processos seletivos enviesados que resultam na sub-representação de pessoas negras em cargos de liderança, ou em culturas corporativas que toleram microagressões e um clima de exclusão. Reconhecer essa dimensão estrutural é o primeiro passo para um combate efetivo e duradouro, transformando as empresas em espaços verdadeiramente equitativos.
Nas instituições bancárias isso não é diferente. Segundo dados publicados em uma cartilha elaborada pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo, verificou-se que a remuneração média das mulheres negras (pretas e pardas) é, em média, 38% inferior à remuneração do bancário branco do sexo masculino. Para que as mulheres negras bancárias recebam a mesma remuneração que os homens brancos bancários teriam que trabalhar num mês de 48 dias, ou seja, trabalhar mais 18 dias durante o mês. O ano da bancária negra precisaria de mais 7 meses para que a igualdade salarial fosse estabelecida; Tal situação é também reflexo da menor participação das mulheres negras em cargos de liderança. https://spbancarios.com.br/sites/default/files/arquivo_destaque/cartilha-desconstruindo-racismo.pdf .Enquanto os homens brancos respondem por 39% dos cargos de liderança, as mulheres negras respondem por apenas 10%. Frente a esta realidade, a categoria bancária tem desempenhado um papel relevante de combate ao racismo e outras formas de discriminação, realizando ações de mobilização, como a criação da Comissão de Gênero, Raça e Orientação Sexual; a mesa temática sobre Igualdade de Oportunidades, que pauta discussões para implementação de cláusulas nas negociações coletivas; e a criação do Censo da Diversidade da categoria, que mapeia o perfil dos bancários.
O Racismo Individual também está presente no cotidiano das instituições bancárias, e é mais perceptível pois ocorre nas relações interpessoais cotidianas. Enquanto o racismo institucional se manifesta nas políticas, normas e estruturas das organizações, o racismo individual é o ato discriminatório praticado por uma pessoa contra outra, de forma direta e consciente ou, por vezes, através de vieses inconscientes que resultam em ofensas:
- Xingamentos e Ofensas Diretas: Uso de termos pejorativos e racistas, prática de injúria racial, ou negação explícita da capacidade profissional por causa da cor ou raça.
- "Piadas" e Comentários Preconceituosos: Observações que ridicularizam traços físicos, cabelo (como o cabelo crespo), cultura ou sotaque de pessoas negras. Embora possam ser disfarçadas de "brincadeiras", essas ações configuram microagressões que criam um ambiente hostil e depreciativo.
- Exclusão e Isolamento: Recusa em interagir, atribuir tarefas de menor relevância ou ignorar a participação de colegas negros em reuniões ou decisões de forma sistemática.
- Questionamento Constante da Competência: Exigir comprovação de competência de um funcionário negro em um nível muito superior ao exigido de seus pares brancos.
O combate a esses atos é crucial, pois a tolerância ao racismo individual legitima o racismo institucional, sinalizando que a discriminação é aceitável na cultura corporativa. É por isso que a Lei nº 14.532/23 equiparou a injúria racial ao crime de racismo, elevando a gravidade legal dessas ofensas no Brasil.
Quando um funcionário comete um ato de racismo ou injúria racial no ambiente de trabalho, a empresa deve agir de forma imediata, rigorosa e transparente, utilizando uma combinação de procedimentos administrativos, disciplinares e educativos. O objetivo é garantir a justiça para a vítima, cumprir a legislação e reforçar o compromisso da empresa com uma cultura antirracista.
Neste contexto, é de extrema importância que as instituições bancárias assumam um papel proativo e incisivo no combate às ações de discriminação e preconceito racial em seu ambiente. Não se trata apenas de uma obrigação legal, mas de um imperativo ético! Para tanto, é fundamental investir em políticas de inclusão e diversidade bem estruturadas por meio da revisão de processos de recrutamento e seleção, da promoção de programas de mentoria e desenvolvimento para talentos negros, da criação de canais de denúncia seguros e confidenciais, e da aplicação de sanções rigorosas para qualquer ato de discriminação. Além disso, procedimentos disciplinares e aplicação de penalidades devem ser tomados com base na Lei nº 14.532/23) trata a injúria racial como crime análogo ao racismo, como crime inafiançável e imprescritível e também informar à vítima que o ato também constitui crime e que ela tem o direito de realizar uma denúncia policial. A empresa pode e deve cooperar com as autoridades de segurança pública e judiciais, fornecendo as informações obtidas na sindicância.
Por fim, promover ações educativas, de prevenção e reparação pode e deve ser feito de forma permanente e sistemática, por meio de treinamentos obrigatórios sobre as diferentes manifestações do racismo e as legislações antirracistas, em especial as Leis 7.716/89 e 14.532/23 e ainda por meio de uma comunicação institucional forte, que reforce a política de tolerância zero da instituição com a posturas racistas.
20 de novembro:Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.
Fonte: SBPNR





